quinta-feira, 27 de agosto de 2015

A pleno vôo





Há almas  desprendidas que visitam outras
desde que chega o anoitecer, pela madrugada, até à aurora.
passando pela rósea  poalha de milhares de sonhos perdidos ou achados,
revelados por raios solares, em suspensão ao olhar cansado
desses viajores movidos pela agônica espera, outros pelos cordéís da saudades.
até outros, por desespero de ciúmes, e ainda os que ,por esperança,
querem velar o sono de quem dorme sem voar também a seu encontro.
As mais dedicadas passam as horas noturnas a consolar os que sofrem,
e lhes levam pirilampos de bondade para acenderem suas trevas desesperadoras..
Essas almas ,sensíveis, bondosas, inquietas, mesmo no pretenso sono  esperado,
vão se cruzando pelos espaços úmidos  com as corujas  e os mochos,
owns, lechuzas y búhos, que as olham com seu olhar intenso ,aceso e guardião
e se energizam para suportar-se , a si mesmos, sozinhos e desgraçados .
ou decididos, seguros e intimoratos, e também para suportar
aqueles que lhes faltam com a sinceridade, ou dignidade ,
ou que não podem atravessar  os mesmos limites
-por covardia, preguiça ,ou responsabilidades impossíveis de descartar.
Depois de cruzarem seus olhares perdidos na amplidão,
com esses voadores tão belos e metafóricos, essas almas de seda pura,
retornam menos frágeis, mais fortalecidas , dessa fortaleza tão dúctil quanto o ouro,
menos feios e mais belos,dessa beleza de casulos e capulhos e nuvens e sementes.
Isso tudo contou-me a idosa corujinha , de dentro do oco de sua árvore-casa,
e ao finalizar, disse-me que ela não lograva mais voar tão longe quanto desejaria .
depois de ficar sem a parceria , sem filhos e sem os amigos primevos.
também já não atravessa o rio da noite derramado por Nix.
pois precisa dormitar a intervalos regulares
depois de receber orvalho  e néctar trazido por um colibri amigo...
Escutei o silêncio, o tempo, o trote dos cavalos selvagens dentro de meu coração.
E então ,minhas asas de espelhos soltaram-se, tintilaram ,
fragmentando-se , em milhões de nanoesferas de desejos irrealizáveis.
Uma poeira de brilho, qual o das borboletas gigantes, escreveu no ar,
minhas novas leis.
-Segue agora, sussurrou-me a coruja milenar ,
não precisavas mais desses espelhos embaçados por tuas lágrimas ,
que te endureciam as asas , eles mostravam os quereres dos outros, 
não tuas necessidades pessoais.Liberta-te,presta atenção em ti mesma, 
em teu umbigo, em tua corpografia ,em tua fome e sede., 
Segue um novo roteiro desenhado por ti mesma,
pontilhado de tuas próprias expectativas. anseios 
Não te deixes seduzir por manipuladores, sonsos, aproveitadores 
de tua docilidade ,natural dos nascidos em signos de águas mansas...
Para aquietar teu instinto de proteger os injustiçados, os mais fracos, 
não precisas ajudar quem sequer precisa de tua e.
Deixa de ser uma das almas que atravessam , entre o sono e a vigília,
o teu lugar e o lugar de outrem , pois tua história já cumpriu seus intentos .
Reforma-te  em  outra dimensão, deixa que o descanso te permite sonhar
com possibilidades reais- e quando despertares, procura não pensar em algozes 
disfarçados  em protetores querubins.
Quebra o arco, enterra as flechas, não te arqueies mais.
Então, sacudi-me e os últimos fragmentos de espelhos inúteis,
caíram ao chão, onde nada semeariam,até ao final de minha temporalidade.
Pela primeira vez, senti-em tão livre, que subi em uma árvore altíssima,
 acomodando minhas asas , num oco de onde pisquei  para ver melhor o estrelário,
 e o voejar de outras almas  ainda no estágio de ,semeando  ilusões ,
esquecerem-se de si mesmas...Como eu fizera por decênios.
-e principiei a escrever minhas própria leis,perplexa e leve e aliviada...
Eu não sabia que também era uma coruja, desde a época
em que a História sem fim ainda não começara a ser escrita!
E então, depois de concluir  as regras enluaradas de minha mente lunar,
adormeci depois de tantos trabalhos , travessias ,trancos,transtornos  e tragédias,
para além das travessuras de meu lado sempre jovem,
para aquém de meus controles equivocados e inúteis.

Clevane Pessoa
28/08/2015





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